Antes do palco, do cenário da TV, das câmeras de cinema, a estrela
maior da arte dramática brasileira, a atriz Fernanda Montenegro, era
conhecida apenas pela voz. Ela era a locutora e radioatriz Arlete
Pinheiro, da Rádio MEC. Fernanda, que começou na
emissora com 15 anos de idade, reconheceu que foi em um estúdio sem
câmeras que nasceu a atriz que iria fazer um país inteiro reverenciar,
se orgulhar e se emocionar. Nesta quarta (16), essa carioca, que criou o
próprio nome artístico e levaria a sensibilidade brasileira para o
mundo, completa 95 anos de idade.
“Eu era a locutora Arlete Pinheiro e a radioatriz Arlete Pinheiro.
Quando fui escrever, achei que era muito ‘Arlete Pinheiro’. Aí inventei
esse nome (Fernanda Montenegro) para redigir”, disse a atriz, em
entrevista à Rádio MEC há três décadas. “A primeira
coisa que fiz no teatro foi a partir de um convite de uma colega que
fazia parte do radioteatro [da Rádio MEC]”.
Fernanda foi indicada ao dramaturgo Adacto Filho, que era o diretor,
e, para ela, um “ensaiador à moda antiga”. “Foi nesse teste que pisei no
palco de forma mais consciente pela Rádio Ministério”, lembrou, em
entrevista à Sociedade de Amigos Ouvintes da Rádio MEC.
"Comecei minha vida"
A atriz saiu do radioteatro, foi para os palcos e, depois, direto
para a televisão - também em entrevista, em um episódio do programa Kinoscope, da Rádio MEC, apresentado pelo produtor Fabiano Canosa, Ela celebrou a volta ao local especial. “Estou aqui no estúdio da Rádio MEC, onde comecei a minha vida”.
Não só a dela. Fernanda lembrou ainda do marido e colega de trabalho
Fernando Torres (1927 - 2008). O casal formava uma dupla de locutores
que se dirigia ao público como “caros ouvintes”. “Esse programa ‘Falando de Cinema’ foi uma ideia do Fernando. Tinha cenas e bastidores”.
Também em entrevista histórica à Rádio MEC, a atriz
recordou que a equipe na rádio teve uma professora de interpretação
chamada Esther Leão. “Eu me lembro que o primeiro programa foi uma
adaptação da peça “Sinhá Moça Chorou”, de Ernani Fornari. E aí
comecei a trabalhar em rádio e teatro. Essas aulas eram dadas algumas na
própria emissora e outras no Ministério da Educação”.
Sentimento e técnica
Ela citou as aulas de interpretação na sua formação. “Como por um
sentimento numa proposta de trabalho em ambiente de um veículo
artístico. Nesse primeiro trabalho, fomos muito felizes. E começamos a
fazer um radioteatro por semana”, disse em entrevista no final da década
de 1990.
Desde então, no currículo, estão pelo menos 65 espetáculos, 18
filmes, 14 novelas e dezenas de prêmios como melhor atriz. A estreia no
teatro ocorreu em 1950, na peça "Alegres Canções nas Montanhas", ao lado de Fernando Torres.
"Figura exponencial"
Fernanda Montenegro é imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL)
desde 2022 e ocupa a cadeira 17. Também imortal, a escritora Rosiska
Darcy de Oliveira, considera Fernanda a maior atriz brasileira de todos
os tempos.
“Fernanda é figura feminina exponencial da cultura brasileira. Tenho
por ela a mais absoluta reverência. Forte amizade e foi realmente um
orgulho muito grande quando, há 15 anos, encenamos pela primeira vez o ‘Viver sem tempos mortos’, com direção do Filipe Dias”, afirmou a escritora.
No cinema, entre tantos prêmios, ficou na memória recente dos
brasileiros o Urso de Prata, em Berlim, pela atuação no papel de Dora,
em Central do Brasil (1998), de Walter Salles. O trabalho rendeu a indicação ao Oscar de melhor atriz.
Esse reconhecimento não veio, mas a Associação Norte-americana de
Críticos de Cinema rendeu a ela o prêmio de atriz do ano, entre outros
troféus. Em 2013, conquistou o Emmy Internacional como melhor atriz pelo
papel de Dona Picucha no especial “Doce de Mãe”. A atriz faz ainda participação especial no filme “Ainda estou aqui”, de Walter Salles. O longa representa o Brasil para tentar uma indicação ao Oscar de melhor filme estrangeiro.