A notícia publicada pelo jornal Valor
Econômico na última segunda feira, 29/01, de que o “Setor de cartões
propõe acabar com o parcelado sem juros” foi recebida com contrariedade
pelas empresas entrantes no setor de pagamentos e por setores do varejo.
Elas reiteram que a sugestão não se trata de uma proposta da indústria,
mas apenas de uma associação, a ABECS (Associação Brasileira das
Empresas de Cartão de Crédito e Serviços), cuja governança reflete
essencialmente a posição dos grandes conglomerados bancários do país.
Segundo Augusto Lins, presidente da
ABIPAG (Associação Brasileira das Instituições de Pagamento), que
representa algumas das principais novas empresas no setor, com o
surgimento das fintechs e uma série de novos modelos de negócios e
tecnologias, a ABECS não representa mais integralmente o setor de
cartões. De acordo com ele, a proposta apresentada pela ABECS significa
uma transferência de renda do consumidor e do varejo, para os grandes
bancos emissores. Isto é, com um suposto fim do “parcelado sem juros” (o
parcelado habitualmente oferecido pelo varejo), o consumidor deverá
compulsoriamente recorrer a um crédito com os principais bancos
emissores para manter seu padrão de consumo. Considerando as taxas de
juros atualmente praticadas pelos bancos, estima-se que essa medida
custaria aproximadamente R$ 90 bilhões no resultado do varejo, devido à
redução do consumo.
Em outras palavras, o montante que os
consumidores poderiam utilizar para adquirir bens ou serviços no varejo
terá que ser destinado para quitar juros de suas dívidas de empréstimos
ao consumo. Portanto, o aparente ganho do varejo por receber antecipado
se transformará em prejuízo com perda de venda aproximada entre 10 e 15%
do volume transacionado atualmente pelo comércio. Para Lins, a proposta
contraria a própria Agenda BC+, estabelecida pelo Banco Central e não
deve ir adiante.
Conforme informação recente, o presidente
da UNECS (União Nacional das Entidades de Comércio e Serviço), Paulo
Solmucci, indica que “as vendas no parcelado lojista (“parcelado sem
juros”) têm peso significativo no volume total do varejo. Por meio dela,
os lojistas conseguem atrair clientes para seus estabelecimentos. Seu
fim fatalmente reduziria de forma significativa as bases de venda do
comércio brasileiro”, conclui Solmucci.
Em conversa recente com diretores do
Banco Central, o representante do varejo reiterou a importância de se
reduzir o custo da transação com cartões. Nesse sentido, reforçou o
empenho do regulador em reduzir nesse primeiro momento o custo nas
transações de débito para estimular o uso do meio de pagamento.
Para Solmucci, “a taxa de desconto
cobrada de estabelecimentos comerciais a cada operação realizada com
cartões, MDR, tem caído para o varejo, mas para esse movimento
continuar, o intercâmbio bancário (negociado entre bancos emissores e
bandeiras sem interferência do varejo) precisa cair, uma vez que essa
tarifa tem limitado o que a competição pode entregar para o varejista”.
Em complemento, Solmucci indica outra
prática que tem impacto no setor varejista: o aumento arbitrário de
emissão de cartões premium, cujo as tarifas de intercâmbio são mais
altas, o que aumenta ainda mais o custo ao varejo. Segundo dados do
Banco Central, a quantidade deste tipo de cartão no mercado mais que
dobrou nos últimos anos, partindo de 13% em 2008 para 27%.
Segundo Augusto Lins, “o varejista está
pagando salas vips em aeroportos, pontos e milhas para portadores que
são isentos de suas anuidades. Uma redução de intercâmbio pode
potencialmente entregar de R$ 3 a 10 bilhões ao ano de economia direta
para varejistas”.
Pesquisa publicada pela Consultoria
Tendências[1] reforça a leitura de Lins. Segundo consta no relatório,
39% dos estabelecimentos pesquisados indicam que os altos custos das
tarifas são as maiores barreiras para aceitação de cartões, enfatizando o
grande potencial da medida sobre o intercâmbio. Em contrapartida, dos
que aceitam essas transações eletrônicas, 91% dos varejistas consultados
indicaram que cartão de débito e crédito geram aumento das vendas e 82%
revelaram que a aceitação dos cartões também aumenta o ticket médio de
suas vendas. “A proposta do crediário já existe nas maquininhas de
cartão em todo Brasil e já pode ser utilizada, não acredito que o
regulador proibirá o parcelamento lojista, principalmente tendo feito
uma medida que viabiliza a diferenciação de preços em função do meio de
pagamento utilizado. O parcelado lojista do cartão de crédito substituiu
os cheques pré-datados e por serem garantidos em cadeia pelos bancos
emissores, são a forma mais barata da sociedade financiar o consumo;
qualquer coisa diferente disso seria criar mais uma reserva de mercado
para pouquíssimos bancos totalmente verticalizados que aumentam o custo
da economia ao não reduzir seus spreads” afirma Lins.
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