Mal começou e um dos programas que simbolizam a franca decadência da TV brasileira já dá mostras de que não há nada tão ruim a ponto de não ser piorado. Uma acusação de estupro que teria ocorrido no programa Big Brother Brasil, transmitido pela rede Globo, culminou em uma série de discussões em relação à qualidade do que chega aos televisores de milhões de brasileiros e brasileiras.
A primeira certeza é que, na era da Internet, das redes sociais e de alternativas para além da velha mídia, não é mais possível realizar “operações abafa” ou tentar escrever a história alternativa aos fatos. Fosse em outras épocas, quando a informação não circulava com a mesma facilidade que vemos hoje, poucos saberiam – e teriam visto – as cenas que deram início à discussão sobre uma suposta violência cometida contra uma das participantes.
Violência que também atinge cada telespectador, ainda sob a ditadura das emissoras. Apesar de serem concessões públicas, que pertencem a cada brasileiro e brasileira, não podem influir, opinar, participar, mudar, propor ou cobrar o direito de ser ver na tela ou de corrigir a versão que vai ao ar para todo o Brasil. A Rede Globo, especialista em fabricar versões – como a célebre cobertura dos comícios por eleições diretas no Brasil, durante a ditadura, transformados em festas para celebrar o aniversário da cidade de São Paulo; ou a manipulação do debate entre os candidatos Collor e Lula, para favorecer o primeiro –, tenta inventar mais uma, fingir que nada aconteceu e acredita que a expulsão de um dos participantes, justamente o acusado de cometer o crime, irá encerrar as discussões em torno da questão.
O debate precisa ser muito mais amplo: o problema não se restringe à qualidade do programa, inclui a necessidade da regulamentação dos meios de comunicação, com regras claras e punição a quem promove a violência e a discriminação racial, sexista e social.
Da mesma forma é preciso combater propostas como a Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 204, de autoria do deputado Ronaldo Fonseca (PR/DF), que permite às emissoras desrespeitarem a classificação indicativa e exibirem programas em horários diferentes do autorizado, além de deixarem de alertar aos telespectadores sobre o conteúdo da atração. Porque, para os monopólios de comunicação, o único termômetro é a audiência, custe o que custar.
E a audiência nada mais é do que sinônimo de lucro. A conta é simples: se 29 milhões de pessoas ligarem a cada paredão do Big Brother, com o custo da ligação a 30 centavos, a Rede Globo e a Telefônica arrecadam R$ 8,8 milhões! Além dos patrocínios que o programa atrai.
Acima de tudo precisamos de um novo marco regulatório para a comunicação que faça valer o capítulo 5 da Constituição e assegure o acesso à informação, pune o monopólio e o oligopólio e institua o Conselho de Comunicação Social, medida que alguns estados já adotam, como é o caso recente da Bahia, onde a CUT é um dos representantes dos movimentos sociais.
Sem a democratização da comunicação não há uma democracia plena. E sem novas regras a liberdade é de empresa, mas não de imprensa. Por enquanto, resta a nós boicotar programas como esse e quem patrocina a baixaria. Porque, no final das contas, somos nós que financiamos essas atrações.
Escrito por: Rosane Bertotti, Secretária Nacional de Comunicação da CUT e Coordenadora Geral do FNDC
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