segunda-feira, julho 13, 2020

Casos de abusos a trabalhadoras domésticas crescem durante pandemia.

“Ela disse assim: ‘Olha, você não vai poder voltar para casa, vai ter que ficar. Vai todo mundo entrar em quarentena’”. Era meio de março quando a trabalhadora doméstica D.A. ouviu da patroa esse pedido. Ela trabalhava havia alguns anos na casa de uma família no Recife e, com a pandemia da Covid-19, a empregadora propôs que ela ficasse um mês direto sem voltar para casa. Depois pediu outros 30 dias. E mais.

Foram 93 dias sem que D.A. visse os filhos e os netos ou saísse à rua. Só descia para pegar encomendas. Quando deixou o local de trabalho, em meados de junho, foi para acompanhar a filha grávida, a ponto de ter bebê.

“Aceitei porque achei que seria um mês. Mas a coisa foi piorando, e fui ficando. Tinha dia em que eu chorava. Uma vez por mês, deixava para meu genro na portaria um dinheiro para a despesa dos meus netos”, diz D.A., de 52 anos, doméstica desde os 10. As iniciais foram usadas para preservar sua identidade.

Ela conta que acordava cedo todos os dias, lavava, passava, cozinhava, e só parava quando a patroa, idosa, ia dormir. Essa rotina incluía os fins de semana. Diz que foi remunerada e não considerou fazer uma denúncia, mas que não repetiria a combinação:

“Tinha hora para acordar, mas não para dormir. Quando voltei para casa, pensei: “Vou dormir três dias seguidos!”. Não consegui. Estava emocionada de chegar em casa, abraçar minhas filhas. Me senti gente”.

Assim como casos de violência contra a mulher, abusos no trabalho doméstico cresceram na pandemia. As denúncias não são centralizadas em uma só instituição, mas especialistas no tema relatam o aumento.

“Junto aos contratos encerrados, denúncias sobre abusos também cresceram. Mas poucas são formalizadas. Muitas mulheres são coagidas a aceitar ficar ou perdem o emprego. A trabalhadora fica por necessidade, às vezes por afeição. É um limite tênue entre o abuso e o trabalho análogo à escravidão”, diz Luiza Batista, presidente da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad).

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